Contos De Criptas

Contos De Criptas

sábado, 4 de janeiro de 2014

Nós Mentimos

Adam entrou na sala e sentou-se com um copo de vinho tinto, cuidando para não o derramar. Ele precisava ter outra conversa com a sua esposa, sabendo que as coisas poderiam ficar difíceis a partir daquele momento. O vinho ajudava a manter a cabeça no lugar.

"Clara"
"Sim, querido?"
"Oh, estou feliz por você estar aqui. Precisamos conversar."
"Tudo bem", disse ela. "Sobre?"
"Você pode me ajudar a entender por que você fez isso? Por que você me machucou deste jeito?"
Clara ficou em silêncio por um longo tempo. Adam então tomou mais um gole do copo de vinho, tentando se manter paciente.
"Sim, desde que você está comigo. Eu não vou deixar você, Adam. Você tem que saber isso."
"Eu estava sofrendo muito. E confusa. Por favor... me perdoe."
"É difícil, Clara."
"Eu sei. Não quero falar sobre isso agora."
Adam levantou-se, passeou ao redor da sala algumas vezes, e finalmente se sentou. "Bem, você está feliz? Você pode pelo menos me dizer tanto assim?"
"Sim, desde que você estiver comigo. Eu não vou deixar você, Adam. Você sabe disso."
"Eu sei, eu te amo, Clara."
"Eu também te amo." Houve outra longa pausa. "Você sabe que eu, as vezes, assisto você enquanto você dorme?" 
"Sério?" Adam de braços cruzados mexeu o líquido escuro, observando enquanto o vidro refletia a luz do quarto. "Eu tenho tido sonhos ruins ultimamente, então basta saber que alguém está lá olhando por mim realmente me acalma. Obrigado, querida."
"Eu tenho que ir agora."
"Já?", ele exclamou, surpreso.
"Ei, eu sei. Você pode ir comigo."
Ele franziu a testa. "Eu... eu posso?"
"Claro. Você sabe como."
"Como?", Ele perguntou, percebendo que não iria gostar da resposta.
"Do mesmo jeito que eu, seu bobo."
O quarto parecia ter escurecido nos cantos, como se as suas sombras amontoadas estivessem conspirando para o espionar. "O quê? Como você pode dizer isso, Clara?"
Outra pausa. "Clara não está aqui" foi a resposta.
Adam sentiu um aperto no estômago. "O que... quer dizer... você não é..?"
"Não. Nunca fui. Mas eu falei com ela uma vez."
A ilusão ardia em seus olhos. "Ah, é? E o que foi que você disse para ela?"
"Salte"
Ele atirou-se da cadeira, esfregando os olhos. "Não, não, porra. C-Como? Como isso é possível? Todas aquelas coisas que ela disse... Eu estava conversando com Clara, caramba. Eu estava falando com ela!" Neste momento Adam não estava muito afim de conversar com o outro enquanto ele estava pleiteando com ele mesmo. Mas logo forçou-se a se sentar.
A prancheta debaixo de seus dedos correram através da placa, soletrando uma mensagem simples.
"Nós mentimos"
As lágrimas começaram a salpicar sobre as letras aleatórias, desfocando o ornamentado. Mas Adam não se atreveu a tirar as mãos enquanto a prancheta continuava a se mover sobre elas.
"Só mais uma coisa." Ele não respondeu.
"Aquelas coisas não eram apenas sonhos."
Adam se lembrava de apenas fragmentos dos seus pesadelos, um beco escuro, um túnel pingando. A excitação em cada sombra... um grito interrompido... as mãos apertando em torno de algo suave e flexível... e o reflexo da lua em uma poça fria e as suas águas negras em sua cintura nua. 
Adam então encontrou sua voz novamente, rosnando "O que você quer dizer?"
"Eu usei você."
Com isso, Adam afastou suas mãos trêmulas e olhou para elas em descrença, se sufocando com uma única palavra: "Por quê?". A prancheta se movia livremente agora, sem necessidade de contato humano, e respondia com uma única palavra:
"D-I-V-E-R-S-Ã-O"



Fonte: Lua Pálida 

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